sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Menino de engenho - José Lins do Rego



Essa obra de José Lins do Rego, nasceu da intenção de escrever a biografia de seu avô materno um patriarca do Nordeste. Mas o romancista soterrou o biógrafo, e a narrativa recaiu sobre a personagem Carlinhos, que, mesmo fictícia, vivencia cenas da infância do autor no mundo do canavial. Estruturada em 40 capítulos, relativamente curtos, é um dos ícones da literatura brasileira. Eis o motivo central dessa edição.


O romance enfoca os abalos das estruturas de uma sociedade rural aristocrática, latifundiária e escravocrata.

O universo complexo apresentado é o mundo de Carlinhos, o menino de engenho, que vai da pureza às deturpações de caráter, de uma realidade totalizadora a um destino individual. À semelhança de seus contemporâneos, a literatura de José Lins do Rego preocupa-se em revelar uma nova visão da realidade social, política e econômica do Brasil, em especial do Nordeste. O espelho das mazelas sociais é o elemento comum aos romancistas de 30, a segunda fase do modernismo brasileiro. O Romance de 30 apresentou dois caminhos nítidos: a prosa psicológica e a prosa regionalista - esta, por sua vez, subdividiu-se em ciclos; e José Lins do Rego é o criador do Ciclo da Cana-de-Açúcar.

Estilo de Época

A construção de Menino de Engenho se apóia em muitos aspectos do estilo predominante à época, o Modernismo. Fica evidenciado pelo enredo que se apresenta o apoio do romance na cultura brasileira. A trama se passa no típico engenho-de-açúcar nordestino, o ´Santa Rosa´, que constitui o cenário da construção do romance. Em torno dele se apresentam os costumes, as crendices, as superstições que refletem bem a nossa cultura.

O modernismo, como se sabe, exalta bem este nacionalismo, esta atmosfera brasileira, visível em todo o romance. Podemos ver no romance uma postura de um certo modo engajada, apesar da predominância no livro da idéia de evocação de uma infância marcada pela magia e o encanto da vida no engenho Santa Rosa.

De uma certa forma, o autor narra a miséria de forma degradante em que vivia o povo e mesmo, em breves momentos, o autoritarismo e a arrogância do Coronel Zé Paulino. A separação em castas é visível no romance, em que negros e trabalhadores compartilham de um regime de escravidão. A vida dos escravos, a senzala, o sofrimento e os castigos que os negros enfrentam no tronco são descritas pelo narrador de forma emotiva.

Um dos grandes momentos narrados na obra é a suntuosa ´enchente´ do rio, vista por Carlos com um misto de admiração e euforia, dando ares do dilúvio enfrentado por Moisés e sua arca na passagem bíblica. As crendices e superstições comuns nas camadas mais pobres dos Nordeste também são trazidas à tona pelo autor, como por exemplo, o aparecimento de lobisomem no Engenho ´Santa Rosa´ e arredores.

O folclore nordestino ganha destaque nas figuras da velha Totonha com suas histórias fantásticas e o cangaceiro Antonio Silvino e seu bando, pela importância que teve o cangaço à época no Nordeste. A alma brasileira fala com altivez neste romance ímpar, mostrando várias de suas peculiaridades. Importante observar que o estilo do autor mostra bem a forma espontânea, coloquial, com que estes contadores nordestinos são apresentados.

Foco Narrativo

O romance é narrado em primeira pessoa, pelo narrador-personagem Carlinhos, desenvolvendo-se em quarenta capítulos, realizando-se sob uma estrutura memorialista. Desse modo, o ponto de vista interno não só aproxima o narrador do leitor, implicando, assim, uma identificação entre essas duas instâncias, como, também, impregna, assim, o texto de intensa afetividade.

A opção por essa modalidade de foco narrativo entra em harmonia com o lirismo de que se reveste a narrativa. Narrador e leitor se aproximam do universo do feudalismo aristocrático, quando este ainda não havia sido engolido pelo capitalismo anônimo; mas o tom emotivo faz com que, de certa forma, o tom de denúncia e crítica social seja amainado, uma vez que a reconstrução desse tempo se dá sob a tessitura de saudosismo, de um talvez desejo em reviver tudo isso.

Tempo

O tempo, numa perspectiva simplista, é apresentado de forma cronológica: o narrador, o menino Carlinhos, tem quatro anos no início da narrativa, e está com doze anos, quando o livro termina. Entanto, Massaud Moisés, em ´Dicionário de termos literários´ (São Paulo: Cultrix, 1999, p. 453-454), chama-nos a atenção para o fato de o tempo, principalmente em termos de romance, ´provavelmente constitua o ingrediente mais complexo e o mais relevante: de certo modo, tudo no romance forceja por transformar-se em tempo, que seria, em última instância, o escopo magno do romancista.´

Nesse sentido, o ficcionista, tendo absoluto domínio sobre o tempo, pode acompanhar a personagem em toda a sua existência, mas tal expediente não exclui o haver do tempo psicológico, que se inscreve na narrativa quando o motivo textual são as volições da personagens, quando o que está em foco, portanto, é o mundo pastoso de sua subjetividade.

Espaço

O romance se passe na Zona da Mata nordestina, no Engenho Santa Rosa, onde praticamente acontecem todos os fatos marcantes do romance, na região que separa os estados de Pernambuco e Paraíba, dedução feita pelas transcrições das paisagens e das ocorrências, como a cheia do Rio Paraíba, e da vida dos engenhos de cana-de-açúcar.

Dentro deste espaço do engenho são descritos outros ambientes, como a senzala, a casa-grande, a cachoeira, o engenho Santa Fé, do coronel Lula de Holanda, entre outros de menor importância.

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